Agosto. Segunda-feira. Tarde. O rapaz, chamado Lucas, tinha no rosto uma expressão indiferente, senão tediosa. Na sua mão, uma pequena máquina manipulada com destreza duvidosa, mas suficiente. Cada fio que caía embalado pelo som incansável do aparelho revelava algo novo.
Em oposição ao semblante do rapaz, eu observava atentamente cada detalhe. Queria garantir que aquele momento ficaria registrado na minha memória. Então começaram a surgir: cicatrizes. Mais do que pensei ter. Mais do que lembrava ter.
Aquela briga com minha irmã mais nova há muitos anos atrás... Aquele dia em que caí enquanto corria e acertei a quina de alguma coisa... Acho que era isso... E essa? De onde veio? E aquela?
Eram cinco no total. Das quais apenas uma tinha origem certa. As demais estavam lá para provar que as tinha vivido, mas minha mente não me dizia o que. Sensação engraçada aquela. Misto de descrença e desagrado. Desconforto.
O som findou. Meu reflexo no espelho mostrava que agora estava completamente careca. Acho que nem quando nasci tive tão pouco cabelo. Pela primeira vez em todos os meus quase 26 anos de historia, não tinha como me esconder.
Cada um daqueles fios de cabelo era ao mesmo tempo uma parte do meu ego e um pedaço da minha armadura. Desde pequeno sempre me senti tão frágil, mesmo usando de todos os recursos que dispunha para mostrar o contrário pro mundo. Agora eu estava ali, com minha armadura no chão, nu, leve. Não tinha mais motivo para me esconder. Precisava provar para mim mesmo que me bastava, sem truques, sem ego.
Passei a mão por toda a careca e senti o toque áspero dos minúsculos fios que escaparam à máquina. Olhei mais uma vez cada uma daquelas cicatrizes. São feridas que nunca fecharão completamente e, mesmo que não me lembre de onde vieram, não me importo. Eu aceito.
Uma vez ouvi a frase: "Ria, e o mundo rirá com você. Chore, e chorará sozinho". Bom.. Diante de mim mesmo naquele espelho, eu sorri.
Made of Steel
Nenhum comentário:
Postar um comentário